Arte que usa a palavra como forma de expressão!
Junto com a poesia medieval floresceu a prosa de ficção, cuja importância está revelada nas famosas novelas de cavalaria. São assim chamadas porque narram aventuras de cavaleiros andantes ou de guerreiros investindo contra os mouros ou sarracenos.
A novelas de cavalaria tiveram início com as canções de gata - poemas importantes que retratavam ações e feitos heroicos praticados por guerreiros valentes e lendários. Mais tarde, as canções de gesta ficaram entremeadas de enredos amorosos, como no caso do histórico poema "Chanson de Roland", na França, no século XI.
Com o passar do tempo, essas canções passaram a ser narradas em prosa, o que veio facilitar ainda mais a sua tradução e popularidade. Por volta do ano 1200, apareceu a conhecida novela Lançarote, que abrangia A demanda do Santo Graal e A morte do rei Artur. Vieram depois Tristão e Isolda, Galaaz e outras.
De acordo com o assunto tratado, as novelas de cavalaria agrupam-se em três ciclos: a.Ciclo carolíngio: em que se narram as façanhas praticadas por Carlos Magno e pelos Doze Pares de França; b.Ciclo bretão ou arturiano: em que são narradas as façanhas do rei Artur e dos Cavaleiros da Távola Redonda; c.Ciclo clássico: em que se contam lendas e histórias da Antiguidade Clássica.
No primeiro período medieval, em meados do século XIII, as novelas que mais importância tiveram em Portugal foram as do ciclo arturiano, especialmente as três traduzidas e adaptadas para o vernáculo: José de Arimateia, História de Merlin e A demanda do Santo Graal. Seu tema gira sempre em torno do Santo Graal - o vaso sagrado e milagroso no qual José de Arimateia havia recolhido as últimas gotas do sangue de Cristo.
No segundo período medieval surge em Portugal outra novela muito expressiva e também ligada ao ciclo arturiano ou bretão, Amadis de Gaula, cuja autoria é disputada entre o espanhol Garci Ordoñez de Montalvo e o português João da Lobedira.
Os ideais cavaleirescos, contudo, aos poucos vão perdendo seu poder de atração. Os autores que escreviam novelas de cavalaria começam a ser criticados e ironizados, e o gênero sofre forte desgaste por conta das incontáveis repetições do mesmo enredo. A vida nas cidades começa a Ter outros interesses, as mentalidades vão se alterando.
Assim, no século XVI, o genial Miguel de Cervantes, ao escrever a famosa novela de cavalaria D. Quixote de la Mancha, ironizou tanto esse gênero narrativo que acabou com ele para sempre.
Como já dissemos, foi "A demanda do Santo Graal" a obra que maior influência exerceu sobre a cultura portuguesa em toda a era medieval.
EPOSÓDIO CAVALEIRESCO - Século XIV
"Quãdo os leuarõ ao pááço, fazerõ-lhis tã grãde infynta d'amor e de licide que eles teuerõ que en bõo ponto ali ueerõ; e fezerõ-nos desarmar logo, e preguntarõ-lhis unde erã. E eles diserõ ca erõ da casa de rey Artur.
- Bem seiades uinidos! Disserõ eles. Muy mais uos amamos per en.
E pois forã desarmados, ueo a eles hunu uelho caualeyro e dise-lhis: - Queredes ir comigo? E mostra-uos-ey hunu caualeyro da Mesa Redonda que aqui iaz doente.
- Váámos, disserõ, ca de grado o queremos ueer.
E eles se foy diante e leuou-os atee a terra, e foy a huna porta pequna de ferro, e abriu-a e dise-lhis:
- Étrade e atendede-me ala dentro, e pois amostraruos-ey o que uos promety.
E eles, que se nõ guardauã da trayçom, entrarõ. E el tyrou a sy a porta e çarrou-a, e pois dise-lhis: -Ora fazede o milhor que poderdes, ca iamais nõ seyredes d'aqui se nõ mortos! E esta é a postumeyra uosa auentura."
(da Demanda do Santo Graal)