Observe, a seguir, a diferença entre texto informativo e texto literário:
Texto informativo: Não ocorre no texto nenhum palavra empregada em sentido conotativo (todas estão no seu sentido verdadeiro - denotativo). O objetivo principal do emissor (escritor do texto) é de informar o leitor. Se duas pessoas lerem esse texto não poderão interpretá-lo de maneira diferente porque o texto só permite uma interpretação. Aqui o autor é um jornalista, e pressupõe-se que todos os fatos sejam verdade, até mesmo porque os locais citados podem ser localizados num mapa. É, portanto, um texto informativo - a narrativa jornalística é exemplo de texto informativo.
Texto literário: Há no texto palavra ou expressão empregadas em sentido conotativo, como: "um vermelho indeciso", "voo negro dos urubus", "Tinha o coração grosso", "escaldava os pés"... O narrador não se limita a expressar objetivamente aquilo que vê; ele penetra no interior das personagens, revelando-nos estados de espírito das mesmas ("...Fabiano desejou matá-lo.", "...Fabiano teve pena."). Aqui, o objetivo do narrador é de informar e despertar emoções no leitor. Trata-se de um texto literário, uma vez que a palavra é trabalhada (existe a presença da conotação, das figuras de linguagem) - um romance é exemplo de texto literário.
Texto Informativo
No lombo da jumenta Branquinha estão empilhados os pertences da família: duas panelas pretas, três pratos, três colheres, três copos, uma moringa e uma esteira. Há ainda um rádio, com defeito, que ora vai no lombo da jumenta, ora na mão de Zenaide ou João Honorato do Nascimento. Isso, mais a roupa do corpo, é tudo que o casal possui. Na semana passada, Zenaide e João Honorato, ambos com 30 anos, mais a filha Cícera, ou "Ciça", de 11, estavam na estrada. Depois de juntar tudo o que tinham, atrelar a jumenta e chamar a cachorra Jaqueline, eles deixaram sua cidade natal de Iguatu, no Ceará, e se puseram a caminho na escaldante BR-020, com direção a Canindé, 230 quilômetros ao norte. Ali, se houver emprego - talvez seja pedir demais -, há a presença de um santo considerado forte e generoso, o padroeiro local, São Francisco das Chagas.
Veja. 17 ago. 1983, p. 56
Texto Literário
VIDAS SECAS
A caatinga estendia-se, de um vermelho indeciso salpicado de manchas brancas que eram ossadas. O voo negro dos urubus fazia círculos altos em redor de bichos moribundos.
- Anda, excomungado.
O pirralho não se mexeu, e Fabiano desejou matá-lo. Tinha o coração grosso, queria responsabilizar alguém pela sua desgraça. A seca aparecia-lhe como um fato necessário - e a obstinação da criança irritava-o. Certamente esse obstáculo miúdo não era culpado, mas dificultava a marcha, e o vaqueiro precisava chegar, não sabia onde.
Tinha deixado os caminhos, cheios de espinhos e seixos, fazia horas que pisavam a margem do rio, a lama seca e rachada que escaldava os pés.
Pelo espírito atribulado do sertanejo passou a ideia de abandonar o filho naquele descampado. Pensou nos urubus, nas ossadas, coçou a barba ruiva e suja, irresoluto, examinou os arredores.
Sinhá Vitória esticou o beiço indicando vagamente uma direção e afirmou com alguns sons guturais que estavam perto. Fabiano meteu a faca na bainha, guardou-a no cinturão, acocorou-se, pegou no pulso do menino, que se encolhia, os joelhos encostados ao estômago, frio como um defunto. Aí a cólera desapareceu e Fabiano teve pena. Impossível abandonar o anjinho aos bichos do mato. Entregou a espingarda a sinhá Vitória, pôs o filho no cangote, levantou-se, agarrou os bracinhos que lhe caíam sobre o peito, moles, finos como cambitos. Sinhá Vitória aprovou esse arranjo, lançou de novo a interjeição gutural, designou os juazeiros invisíveis.
E a viagem prosseguiu, mais lenta, mais arrastada, num silêncio grande.
Ausente do companheiro, a cachorra Baleia tomou a frente do grupo. Arqueada, as costelas à mostra, corria ofegando, a língua fora da boca. E de quando em quando se detinha, esperando as pessoas, que se retardavam.
RAMOS, Graciliano. Vidas Secas. 16 ed. São Paulo, Martins, 1967. P. 8